Por amor à escrita e à leitura: Crispim revisitado
FONTE: Jornal O DIA, folha Opinião, pág. 6, de 18/10/2013
Por: Pedro Pio
Fontineles Filho – Doutorando em História Social (UFC)/Professor de História
(UESPI)
No mês de outubro, no qual é
celebrado o dia das crianças, o dia do professor e o dia do Piauí, dentre
outras comemorações, a indicação de livros parece ser uma ação que cria um forte
elo entre os professores e as crianças, e, por consequência, entre eles e toda
a sociedade, visto que um povo que lê é um povo capaz de se compreender e de se
(re) inventar. Por tal razão, a sugestão do recém-publicado“Crispim e a Sétima
Virgem” (2013), de autoria de Eduardo Prazeres Fonseca, é uma boa pedida para
contemplar essas três datas comemorativas.
Eduardo Prazeres, como é conhecido,
tem demonstrado grande interesse pelo ato de escrever. É autor de outros dois
livros: “Reflexos do Nada” (2002), livro de poesias; e “Balada Suburbana” (2010),
livro de contos que traz uma das marcas de sua escrita, a jovialidade da
linguagem. Isso significa que, em meio à busca da escrita minimamente formal, o
autor não se furta da possibilidade de tornar seus escritos mais suaves, de
fácil leitura e entendimento. Mais que isso, uma leitura sedutora, que alcança
um público variado. Vale lembrar que Eduardo Prazeres traz para seus textos
aspectos de sua personalidade, de sua pluralidade e de sua versatilidade. Além
de ser um poeta, contista e, agora, um promissor romancista, ele, desde muito
tempo, tem se dedicado, ora com mais, ora com menos intensidade, aos ambientes
da atuação artística e teatral. Integrou o Núcleo de Criação do Teatro João
Paulo II, onde atuava como ator e como ministrante de oficinas de teatro,
especialmente para os jovens da região do Grande Dirceu, atividade que ainda
desenvolve. Escreve textos para o teatro, como aquele que compõe a peça de
grande sucesso, “Quem não surta vez em quando!?”, interpretada pelo grupo
Prelúdio. É importante observar isso, pois sua escrita é rica em teatralidade e
movimento. Seus textos, em grande medida, parecem ser pensados, mesmo que de
maneira inconsciente (talvez mesmo até consciente), para os palcos do teatro.
Em seu livro de estreia no romance,
“Crispim e a Sétima Virgem”, Eduardo Prazeres traz à tona do fazer literário
uma versão moderna e dinâmica de uma das lendas mais emblemáticas da cidade de
Teresina e, em grande escala, do Piauí. A escrita poética, que deu a Eduardo
Prazeres o fôlego para seu primeiro livro, está presente nesse romance, mesmo
que não seja no sentido estrito do termo poético, mas sim, no que se refere à
sensibilidade descritiva de sua narrativa. A escolha da
lenda é explicada pelo próprio autor: “Gosto de temas fantásticos porque eles
são a ferramenta para expandir a imaginação, para transcender o corriqueiro e
(ainda que metaforicamente) a condição de mortal”. E é nessa expansão da
imaginação que o público deve se envolver na leitura desse romance.
O livro está repleto de elementos
que povoam a imaginação, o que não poderia ser diferente ao se tratar de um
texto que parte de uma lenda, entrecortado por aventura e mistério. Os
capítulos são relativamente curtos, o que demonstra a sua ligação com a escrita
rápida dos contos, como a feita em seu segundo livro.Para as crianças,
adolescentes, jovens e adultos, o livro é a oportunidade de (re) lembrar-se da lenda
de Crispim e é a possibilidade de lançar outros voos imaginativos, conduzidos
pelo escritor. Apenas conduzidos e não aprisionados, pois, a partir daquilo que
sugere o texto de Eduardo Prazeres, o leitor pode criar novas estórias. É isso,
inclusive, uma das funções, se é que se pode falar de “função”, das artes e da
literatura: despertar para a imaginação e para o sentir. Para os professores,
sobretudo aqueles voltados para o ensino da Linguagem e da Literatura, é a
possiblidade de levar, para seus alunos, temáticas tais como a influência da
fala na escrita, vícios de linguagem, coloquialismos, contrações, que estão
presentes ao longo de todo o texto. Além disso, analisar tipos literários,
personagens e, em primeiro plano, pensar a importância das lendas na construção
de identidades e de valores, a partir do incentivo do gosto pela leitura.
Nossa história e nossa cultura são
riquíssimas e o são pelos inúmeros sujeitos que as constroem constantemente,
aos quais se junta Eduardo Prazeres. No campo da escrita literária, há vários
valores potenciais, que ainda não são conhecidos pelo público ou que são
excluídos pelo próprio campo literário, como bem salientou Pierre Bourdieu. É
nesse campo que são criados critérios, por vezes velados e imperceptíveis, na
disputa de poder. Ser considerado um “literato” está inerente ao jogo das
relações de manutenção de tal poder, como é o caso dos cânones literários.
Inscrever-se nesse campo é estar preparado para os discursos de aceitação e de
negação, pois isso faz parte das “regras da arte”. Nesse sentido, tinha razão
Rubem Alves ao dizer que “o escritor tem amor, mas não tem poder”. Eduardo
Prazeres se aventura nesse campo, sem a preocupação primeira de ser bem ou mal “recepcionado”
pelos críticos, mas com o intuito mesmo de socializar aquilo que lhe faz
perder-se no tempo, escrevendo e reescrevendo.Ele escreve, como poucos, por
amor à escrita. Seu livro é um excelente presente, não só para professores e
crianças, mas para qualquer pessoa. Resta dizer: aventure-se no universo de
“Crispim e a Sétima Virgem”!
NOTA: (de Eduardo Prazeres)
Se
meu trabalho frutificar e prosperar (causa à qual estou dedicando a
minha vida), e um dia eu vier a ser um escritor agraciado com uma
fortuna crítica, o texto de Pedro Pio será lembrado como o
primogênito desta família ensaística que porventura venha a existir; e
desde já, independente de haver ou não outras manifestações, é um texto
que tem todo o meu apreço, pelo grande gesto de atenção justamente no
momento em que ainda sou um escritor principiante. Meu muito obrigado,
caro amigo!
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